A identidade cristã nos dias atuais

terça-feira, 5 de novembro de 2019

19. O ADULTÉRIO


“Qualquer que olhar para uma mulher para desejá-la, já cometeu adultério com ela no seu coração” (Mateus 5.28).

Esta é a segunda ilustração que Jesus deixou acerca do ensino sobre a lei. Os dez mandamentos devem ser entendidos como um todo, um conjunto indissolúvel, já que o último se liga ao atual mandamento focalizado. O propósito inteiro da lei é mostrar a extrema pecaminosidade do pecado, ou seja, a nossa propensão para o mal, a origem de nossos atos: o homem interior. A tendência do homem natural é ver o pecado como uma consequência natural da sua evolução, pois, tendo evoluído do animal, segundo crê, ele está se desfazendo lentamente de sua natureza animalesca. Não é esta, no entanto, a verdadeira doutrina bíblica do pecado. O homem natural não entende por que Jesus morreu nem o verdadeiro significado da cruz. A encarnação do Filho de Deus não seria necessária se o ser humano não fosse pecador. "Não há justo, nem um sequer", afirmou Paulo.
A regeneração, o novo nascimento deve acontecer por causa do pecado humano e do sacrifício de Cristo. Para aqueles que não entendem corretamente a doutrina do pecado, a cruz e o novo nascimento não fazem sentido. Pouco se prega sobre o pecado hoje. A rejeição do Evangelho leva o homem ao inferno e o próprio Jesus alertou muitas vezes seus seguidores para a dificuldade que era o caminho estreito e a porta apertada que conduzem à presença de Deus. O verdadeiro evangelismo começa pela santidade de Deus, passa pela pecaminosidade do homem, pelas exigências da lei, sua punição e pelas consequências da escolha humana. O pecado não é exatamente o que eu faço, mas aquilo que me impulsiona a fazê-lo. É como uma enfermidade, que nasce dentro do homem e se manifesta em sintomas, que são as obras pecaminosas. Ele é sutil: acontece por procuração, através de terceiros, com o nosso interesse em literaturas, reportagens e filmes que o abordem, por exemplo; ele nos engana, levando-nos a pensar que somos filósofos ou sociólogos querendo entender coisas escabrosas. O pecado é um fator de perversão e ele torna nossos membros e instintos, criados por Deus de modo perfeito, como nossos inimigos. Mãos, olhos e outros componentes corporais nossos podem se tornar empecilhos para o nosso viver. O pecado a tudo distorce, ele perverte o ser humano, transformando o bem que nele existe em mal, além de destruí-lo, introduzindo a morte na vida do homem.
Há, porém, uma maior profundidade na fala do Salvador quando ele sugere eliminar algum membro do corpo para que o todo não seja lançado no inferno. O que Jesus queria dizer era que, por mais importante que alguma coisa seja para uma pessoa, se isso for servir de armadilha, fazendo-a tropeçar, seria preferível desfazer-se dessa tal coisa. Precisamos lembrar a importância da alma e do seu destino, eliminando qualquer adversário que se apresente no nosso caminho. Se minhas faculdades, propensões e habilidades me conduzem ao pecado, então deverei livrar-me delas. "Que aproveita o homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?"
Se reconhecêssemos o que os puritanos chamavam de "a praga dos nossos próprios corações", isso nos ajudaria a buscar a santidade.  O nosso coração deveria desconhecer a amargura, a inveja, o ciúme, o ódio e o despeito, mas caracterizar-se sempre pelo amor. Paulo afirmou que “se vivermos segundo a carne, caminhamos para a morte; mas, se pelo Espírito mortificarmos os feitos do corpo, certamente viveremos”. É preciso, portanto, que o corpo seja mantido em sujeição, reduzido à escravidão, mortificando nossos membros.
Um preço imenso teve de ser pago para que fôssemos libertados do pecado. Jesus suou gotas de sangue no Jardim do Getsêmani, suportou toda agonia e todo sofrimento e finalmente morreu na cruz pelo nosso pecado. Isaac Watts disse que esse amor "requer a minha alma, a minha vida, o meu tudo". A nossa santificação não pode ser buscada por nossas próprias forças, mas no poder do Espírito. Aquilo que o autor chama de poluição do pecado", o que faz com que, embora um homem não esteja praticando nenhum pecado num dado momento, ele continue sendo pecador, precisa ser por nós reconhecido. Sem pecado, poderemos ver a Deus face a face, estar de pé diante dele, sem qualquer culpa, sem mancha nem motivo de reprimenda.

18. COMO LIDAR COM A IRA

“Vocês ouviram o que foi dito aos seus antepassados: ‘Não matarás’, e ‘quem matar estará sujeito a julgamento’. Mas eu lhes digo que qualquer que se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento
(Mateus 5. 21-22a).

A justiça que excede a de escribas e fariseus é o ensinamento que Jesus vai reforçar até o final do Sermão do Monte. Não é o contraste entre a lei de Moisés e o ensino de Jesus, mas entre a falsa interpretação da Lei e a interpretação autêntica que nos foi oferecida pelo Senhor da Lei. Jesus deixou seis exemplos acerca de sua interpretação da lei de Deus em contraposição à interpretação dos escribas e fariseus, e o primeiro deles é “não matarás”.
"Não matarás" é um dos dez mandamentos, mas, ao dizerem "quem matar estará sujeito a julgamento", os doutores da lei reduziam o sentido do mandamento apenas a um caso de homicídio literal, num julgamento relacionado apenas ao juízo baixado por algum tribunal local, esquecendo-se do juízo divino. Todo aquele que aceitar apenas a letra da lei e se esquecer do seu espírito, do seu conteúdo e do seu sentido, pode-se persuadir de que é perfeitamente justo aos olhos da lei. Era o que acontecia com o jovem rico, que foi conversar com Jesus, e mesmo com Saulo, antes de se tornar Paulo.
Também nós podemos conceber a lei de Deus conforme a encontramos nas Escrituras, mas, ao mesmo tempo, defini-la e interpretá-la, transformando-a em algo que possamos observar com extrema facilidade, porque só a estamos obedecendo negativamente.
Jesus exprimiu seu ponto de vista em três momentos, e o primeiro deles  é novamente o erro no apego à letra da lei, mas não ao seu espírito. Não matar não é meramente não cometer um homicídio físico literal, mas inclui a ira no coração sem motivo contra algum irmão. A tragédia do povo israelita é que eles perderam de vista o conteúdo espiritual da lei. Tolerarmos a ira em nossos corações contra alguém é o mesmo que cometermos homicídio. Indo um pouco além, o desprezo ao próximo em forma de zombaria ou escárnio é uma atitude que acaba impelindo a pessoa a cometer homicídio, pelo menos no coração. O assassinato não envolve somente a destruição da vida física de outra pessoa, mas também a tentativa de destruição de sua alma e espírito, derrotando aquela outra pessoa de alguma maneira. A nossa Ira deve dirigir-se somente contra o pecado, jamais contra o pecador, pelo qual devemos sentir tristeza e compaixão. É o aviso de Paulo aos Efésios: “Irai-vos e não pequeis”.
Em segundo lugar, Cristo afirma que a reação a tudo isso não deve ser negativa, e sim positiva. Ele afirma que devemos dar passos positivos para nos reconciliarmos com o nosso irmão. É necessário primeiramente consertar a situação com o irmão e somente depois voltar e oferecer o sacrifício a Deus. Não podemos estar bem com Deus enquanto estivermos cometendo injustiça contra nosso semelhante humano. Obedecer é melhor do que sacrificar, dizem as Escrituras.
Por fim, Jesus está dizendo que todas essas ações são urgentes. O cristão precisa chegar a um acordo com seu adversário sem demora. Segundo o dicionário, ira é cólera, raiva, indignação, o que leva a um desejo de vingança. O ódio é uma paixão que impele a causar ou desejar mal a alguém. Esta é uma definição humana para o problema, mas as Escrituras afirmam que a ira não é nossa, mas do Senhor, quando for justa. Ela não pode tomar conta de nosso coração levando-nos a pecar e precisa ser administrada segundo a vontade de Deus.
Os fariseus e escribas sempre foram culpados de reduzir o sentido e até mesmo os requisitos da Lei. Eles já haviam despido esse mandamento do seu grande conteúdo, reduzindo-o meramente a uma questão de homicídio literal, sem nunca se preocupar com o juízo divino. Enquanto aceitarmos a letra da lei esquecendo-nos do espírito, podemos tentar nos enganar, persuadindo-nos de que somos considerados perfeitamente justos aos olhos da lei. A ira guardada no coração é homicídio. Nossa atitude diante da ira não deve ser negativa, e sim positiva: a reconciliação e depois a oferta. Finalmente, há uma urgência em tudo isso, face o nosso relacionamento com Deus